O que na verdade nos embaraça é a nossa cosmovisão, nossas
esperanças e sonhos, os quais na verdade são episódios subjetivos e não fatos
concretos. Decepcionamo-nos com nossas perspectivas mais do que com o fato em
si, as vezes, nem fatos há, e sim sonhos, delírios de um ego que anela o
inatingível, o inexistente.
Assim, concluímos que o sofrimento é gerado muito mais a
partir das nossas internalizações do que de eventos exteriores a nós. Quando
nos decepcionamos, nos frustramos, na verdade estamos nos decepcionando e
frustrando, não com a pessoa ou situação que nos proporciona sentimentos
dolorosos, e sim com a nossa perspectiva equivocada com relação a pessoas,
situações e fatos.
É temerário basear a felicidade em bens materiais,
conquistas das mais diversas ou em pessoas. Calligaris, Doutor em psicologia,
fala de “conceito de bem estar”, em lugar do termo felicidade. Para ele, nenhum
desejo satisfaz o homem plenamente, embora, de forma errônea, achemos que a
felicidade esteja na consecução dos nossos sonhos e desejos mais íntimos.
Bem antes de Calligaris, o livro de Eclesiastes já apontava
para o engano de se procurar a felicidade em coisas externas a nós.
Resolvi no meu coração
dar-me ao vinho, regendo-me, contudo, pela sabedoria, e entregar-me à loucura,
até ver o que melhor seria que fizessem os filhos dos homens debaixo do céu,
durante os poucos dias da sua vida. Empreendi grandes obras; edifiquei para mim
casas; plantei para mim vinhas.
Fiz jardins e pomares
para mim e nestes plantei árvores frutíferas de toda espécie. Fiz para mim
açudes, para regar com eles o bosque em que reverdeciam as árvores. Comprei
servos e servas e tive servos nascidos em casa; também possuí bois e ovelhas,
mais do que possuíram todos os que antes de mim viveram em Jerusalém.
Amontoei também para
mim prata e ouro e tesouros de reis e de províncias; provi-me de cantores e
cantoras e das delícias dos filhos dos homens: mulheres e mulheres.
Engrandeci-me e sobrepujei a todos os que viveram antes de mim em Jerusalém;
perseverou também comigo a minha sabedoria.
Tudo quanto desejaram
os meus olhos não lhes neguei, nem privei o coração de alegria alguma, pois eu
me alegrava com todas as minhas fadigas, e isso era a recompensa de todas elas.
Considerei todas as obras que fizeram as minhas mãos, como também o trabalho
que eu, com fadigas, havia feito; e eis que tudo era vaidade e correr atrás do
vento, e nenhum proveito havia debaixo do sol.
[1]
O que Calligaris diz é similar ao que é relatado em
Eclesiastes. O desejo realizado perde o sentido. As vezes, se deseja muito um
bem, uma viagem, um homem, uma mulher, ou qualquer outra coisa. A concretude
desses sonhos, em si mesmos, não tem condição de proporcionar a felicidade, na
verdade, são instrumentos ilusórios dessa busca.
Do mesmo modo, como o empreendedor registrado em Eclesiastes
reagiu ao chegar na conquista daquilo que desejava, assim agimos com as nossas
realizações. Ao realizar ou conquistar algo, segue-se a euforia, logo depois o
tédio, para então, a busca do próximo feito.
É muito importante ter uma definição de quem somos, onde
queremos chegar e quem são aqueles que nos rodeiam. Nunca esperando demais do
outro, pois quem espera muito do outro, tem geralmente muito pouco em si.
Então, simplesmente viva, ame, compreenda se possível, perdoe se puder, chore
quando necessário, divirta-se sempre, sorria para o mundo. Seja você mesmo, mas
não esqueça de ser… humano.
Wanderley Nunes
[1] Eclesiastes 2.3-11
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