Comentário de Provérbios
Provérbios
1.10-19.
Conselhos para a vida.
10 Filho meu, se os
pecadores querem seduzir-te, não o consintas.
11 Se disserem: Vem
conosco, embosquemo-nos para derramar sangue, espreitemos, ainda que sem
motivo, os inocentes;
12 traguemo-los vivos, como o abismo, e
inteiros, como os que descem à cova;
13 acharemos toda sorte de bens preciosos;
encheremos de despojos a nossa casa;
14 lança a tua sorte entre nós; teremos todos
uma só bolsa.
15 Filho meu, não te ponhas a caminho com
eles; guarda das suas veredas os pés;
16 porque os seus pés correm para o mal e se
apressam a derramar sangue.
17 Pois debalde se estende a rede à vista de
qualquer ave.
18 Estes se emboscam contra o seu próprio
sangue e a sua própria vida espreitam.
19 Tal é a sorte de todo ganancioso; e este
espírito de ganância tira a vida de quem o possui.
Temos agora um tratamento paternal, “filho
meu”, o conselho aqui é para não se deixar seduzir por aqueles que não
respeitam a torah, a família, e muito menos o próximo. “O não o
consintas,” dá a entender que há de fato uma argumentação inebriante e
tentadora por parte dos “pecadores”.
O convite para “derramar sangue inocente”
fala muito do desejo aventureiro, do que comumente chamamos nos nossos dias de
“adrenalina”. A intenção de se experimentar os instintos mais primitivos e
animalescos, ficam patenteados na expressão “traguemo-los vivos, como o abismo,
e inteiros, como os que descem à cova”.
O texto parece falar da morte sem reparação
alguma, final de vida. Tudo indica que o escritor não possuía nenhuma
influência do pensamento helenista, pois aquele que convida o incauto rapaz
para os caminhos da violência, deixa entrever que acredita no homem como alma
vivente - sem uma entidade (alma) imortal – apenas como tendo fôlego de vida,
foi-se o fôlego, vai-se ao pó irremediavelmente. Quando diz “traguemo-los
vivos, como o abismo…” O pensamento é de que seu opositor não viverá em
hipótese alguma, nem mesmo em outra dimensão.
É importante ressaltar, que o homem como possuindo
uma alma imortal, bem como o abismo (sheol), se tornando mais um lugar de
tormento de que apenas e simplesmente um túmulo, é uma construção mais recente
do pensamento judaico, influência clara das crenças gentílicas, sobretudo,
gregas.
…acharemos toda sorte
de bens preciosos; encheremos de despojos a nossa casa;
lança a tua sorte entre nós; teremos todos
uma só bolsa.
O ganho fácil, por vezes ilícito, quase
sempre entorpece o homem. O escritor de provérbios objetivamente reproduz um
tipo de discurso que encanta quem gosta da adrenalina, adora viver
perigosamente, e é um ávido seguidor da lei do menor esforço. A epístola a
Timóteo aborda isso de forma aguda e explícita.
Ora, os que querem ficar ricos caem em
tentação, e cilada, e em muitas concupiscências insensatas e perniciosas, as
quais afogam os homens na ruína e perdição.
Porque o amor do dinheiro é raiz de todos os
males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram
com muitas dores
(I Tm 6.10).
É interessante observar que no texto de
provérbios (versículo 13), há uma demonstração evidente da crença no sucesso do
malfeito, pois diz: Encheremos de despojos a nossa casa… Para em seguida,
demonstrar como estarão envolvidos mutuamente se o companheiro aceitar a nefanda
proposta. “…lança a tua sorte entre nós; teremos todos
uma só bolsa.” Assentindo a tal convite, o incauto, além de se tornar cúmplice,
torna-se sócio no empreendimento do mal.
…Filho meu, não te
ponhas a caminho com eles; guarda das suas veredas os pés; porque os seus pés
correm para o mal e se apressam a derramar sangue.
O conselho paterno continua soando, já que a
ideia aqui é de um pai que é senhor da sua casa, tendo uma grande
responsabilidade sobre ela, o patriarca fará sempre assim, não só porque ama os
seus, mas porque teme a Deus, e na sagrada torah dos judeus, o Senhor de
Israel está acima de tudo, inclusive dos familiares, porém, ordena ao pai de
família que a ame. Logo, o conselho exposto nos versículos 15 e 16, são na
verdade, apelos de um pai, que ama seu filho e é obediente a Deus.
…Pois debalde se
estende a rede à vista de qualquer ave.
Estes
se emboscam contra o seu próprio sangue e a sua própria vida espreitam. Tal é a
sorte de todo ganancioso; e este espírito de ganância tira a vida de quem o
possui.
Há uma preciosa mensagem nos três últimos
versículos. A Síntese de tudo, é que todo malefício projetado contra o outro,
na verdade, é um mal perpetrado contra nós mesmos, não passamos incólumes por
sentimentos ruins “…Pois debalde se estende a rede à vista de qualquer ave.”
Antes de ser direcionado ao outro, o mal é nosso - e isso sem evocar
qualquer pensamento místico ou supersticioso – e para nós retornará altamente
potencializado e danoso.
Demonstra-se isso pelos inúmeros problemas de
saúde causados pelo stress, tensões do dia a dia, e acima de tudo, sentimentos
tais como ódio, rancor, mágoa…O versículo 18 vai mais longe quando diz de forma
indubitável, que todo ganancioso, egoísta, que vive a engendrar projetos no afã
de auferir lucros - insensível ao prejuízo de outrem - o que produz de fato,
são males contra si próprio, pois mesmo prejudicando grave e efetivamente a
terceiros, ele jamais sairá ileso. É a lei da vida.
Foge, outrossim, das paixões da mocidade.
Segue a justiça, a fé, o amor e a paz com os que, de coração puro, invocam o
Senhor (II Tm.2.22).
Wanderley
Nunes.