quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Comentário de Gálatas 1. 13,14 – Extremamente Zeloso



13 Porque ouvistes qual foi o meu proceder outrora no judaísmo, como sobremaneira perseguia eu a igreja de Deus e a devastava.

14  E, na minha nação, quanto ao judaísmo, avantajava-me a muitos da minha idade, sendo extremamente zeloso das tradições de meus pais.


Paulo lembra aos gálatas o que eles ouviram ao seu respeito. O que tenta transmitir com isso, é a razão da sua completa mudança e total abandono da fé judaica; é como se quisesse dizer: Daí eu já vim! Conheço muito bem o proceder dos meus compatriotas e já deixei tudo isso para trás.



Como sobremaneira perseguia eu a igreja de Deus e a devastava – Agora, detalha suas ações, era um perseguidor. A lei mosaica falava sobre condenar o falso profeta, e era assim que Paulo considerava Jesus e consequentemente todos os seus discípulos. Como um austero judeu, não só perseguia com verbalizações, como também usava de meios violentos no intuito de exterminar aquela “seita”, ainda que para isso fosse necessário dar cabo dos seus seguidores.


O que pode ser lido nas entrelinhas, quando cita sua antiga fé rigorosa e combatente, é que, só mesmo uma experiência cognitiva, que lhe trouxesse novas convicções, de fato, teria o poder de fazê-lo mudar de ideia, logo, se isso aconteceu, deveria ser um sinalizador para a igreja da Galácia, seduzida a percorrer as veredas as quais Paulo havia abandonado, justamente por ter encontrado em Jesus “o caminho.”


A grande mensagem do evangelho de Cristo, e que fique bem explícito, de “Cristo”, não da igreja instituída – deixando claro que não somos contra a instituição em si, todavia, aborrecemos e rechaçamos o “engaiolamento” e monopólio da “verdade” produzido por ela – é o amor, a paz, a ética e a aceitação mútua, pois todos, independente da fé, e mesmo os que comungam as mesmas crenças, possuem diferenças entre si, por isso, a grande “verdade” é o Cristo unificador do diferente.


Como dito em ocasiões anteriores, não é o que se fala de Cristo que salva, mas sim Cristo. De modo algum, tal formar de pensar torna inócua ou anomista a minha fé, entretanto, faz com que embora tenha minhas convicções, o Jesus Senhor, torna-se para mim, maior que “o Jesus da igreja”, pertencente e de uso exclusivo de um grupo, cujas práticas os torna detentores da “verdade”, isso não é aceitável do ponto de vista do Cristo glorioso e sem fronteiras.


A asseveração: “Meu Cristo é melhor que o seu” e  “só minha forma de crer é salvífica”, em si mesma é proveniente de um olhar unifocal, incapaz de visualizar um Jesus desprovido de pertencimento religioso. Um Jesus assim, está estigmatizado pelos rituais, dogmas e paramentos litúrgicos, segundo a visão empedernida e embotada dos forjadores do uni pertencente Jesus, na realidade, idealização que atende somente a interesses institucionais.


Paulo em nenhum momento renega sua nação e as crenças do seu povo, na realidade, sabe e fala da sua pátria com orgulho, todavia, aponta para um unificador de povos, e compreende que para isso acontecer, tem que cair por terra tudo que causa divisão e que de fato não diz respeito aos valores  éticos e morais comuns a todos os homens. Algo importante para ser salientado é nada indicar haver nenhuma ilusão por parte de Paulo em converter a nação israelita.


A fala dele aos gálatas trata sobretudo do gentil que abraçou a fé em Jesus e está sendo cooptado por “irmãos” de Jerusalém, os quais tentam enredá-los a tomar emprestado os antigos rituais segregacionistas judaicos, que não possuem em si mesmo o poder de melhorar ninguém pessoalmente, servindo apenas como sinalizador de diferenças e impossibilidades para o estrangeiro desejoso de abraçar o evangelho. Isso era o que Paulo praticara como zeloso Hebreu e é contra isso que se levanta agora.


14 E, na minha nação, quanto ao judaísmo, avantajava-me a muitos da minha idade, sendo extremamente zeloso das tradições de meus pais.


É imprescindível salientar que a carreira de Paulo no judaísmo, foi eivada de ação e militância, poucas vezes vistas em pessoas da sua idade, inclusive com relação aos que divergiam da sua “sagrada fé”. Justamente por ser “extremamente zeloso”, levou às últimas consequências sua fúria contra a “seita dos Nazarenos”.


Entretanto, quando chega a conclusão de que Jesus possuía todas as características messiânicas, se coadunando assim com os seus íntimos e patrióticos anseios, não pensa duas vezes em lançar fora “os excessos” da sua bagagem religiosa, para então carregar o jugo suave e o fardo leve do Nazareno.


É relevante a observação de que a carga religiosa foi deixada para trás, no entanto, o fardo e o jugo de apontar para o mundo a bondade graciosa do evangelho, que “mata” o religioso fanatizado e faz surgir um homem eclesiástico, um ser comunitário, esse sim, o apóstolo dos gentios levou até o fim dos seus dias.


Nesse sentido, o seu zelo extremado de outrora foi transferido para um outro alvo. Uma dedicação como essa, um zelo e um amor dessa envergadura, devem de fato constranger de forma idílica e conscienciosa todo aquele que uma vez se iniciou no “caminho”.



...Pois o amor de Cristo nos constrange, julgando nós isto: um morreu por todos; logo, todos morreram. E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou [1]



Wanderley Nunes



[1] II Co.5.14,15 – Versão Revista e Atualizada.

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